domingo, 9 de fevereiro de 2014

Carestia

http://www.canaldootario.com.br/blog/rio-surreal-precos-surreais/
Eu e Luiza temos um hábito que considero bastante saudável: sempre lemos juntas  um capítulo de um livro antes de dormir. Só falho quando estou muito cansada, ou quando tenho todas as aulas no turno da noite. Nesta última situação, quando eu chego em casa, ela já foi dormir, pois nos trópicos, o dia das crianças começa bem cedo. Às 6 horas da manhã começa a sinfonia dos despertadores dos telefones móveis, daí, o jeito é mesmo levantar. Neste fevereiro atípico, as manhãs são cinzentas, uma chuvinha fina insiste em molhar as plantinhas, poupando-nos o esforço prazeroso de regá-las. Então, fazemos nossas leituras, e, juntas estamos lendo "A Odisséia", de Homero. Terminamos "O Conde de Monte Cristo", de Alexandre Dumas nos últimos dias de janeiro. Ainda em Portugal lemos "O Santo e a Porca", de Ariano Suassuna. Estas obras foram presentes do Tio Rocha, que é professor de Português e Literatura da rede pública. Faziam parte da biblioteca de Matheus e Pedro, e agora passou para Luiza. Lemos e doamos à Bibliotecas ou a amigo.

A obra de Ariano Suassuna  era em texto de teatro. Muito interessante, pois, revesávamos nos personagens. A ação decorre em torno da fortuna secreta de Euricão engole cobra, um rico canguinha que vive para economizar o sagrado dinheirinho, depositando-o numa porca, que guarda num baú debaixo de uma escada. Euricão reclama muito dos preços de tudo e vive a repetir: "Ai, carestia! Ai, Santo Antonio!" Vive para guarda o dinheirinho, e é prisioneiro deste. Não sai de casa com medo que alguém roube-lhe a fortuna. Se tortura porque tem uma linda filha em idade de casar, e, certamente, algum oportunista virá para tomar-lhe a fortuna. Pois bem. Luiza passou um bocado de tempo me chamando de Euricão engole cobra, porque quando morávamos na Europa, eu vivia a economizar uns cobres. Na verdade, era uma questão de sobrevivência. Quem ganhava em Real e gastava em Euro, era fundamental se organizar para o dinheiro não acabar antes do final do mês. Se aqui somos economicamente remediados, na Europa, éramos estudantes pobres. E a realidade tem que ser vivida tal como ela é.

Contudo, quando voltamos ao Brasil, me impressionei com os altos preços praticados, seja para mercadorias ou serviços. Já não basta termos a maior carga tributária do mundo, agora, especialmente em 2014, somos estorquidos em nosso próprio país. Quando íamos à praia antigamente, os vendedores ambulantes julgavam-me pela cor (ou pela ausência dela!) e aumentavam os preços dos produtos, achando que eu era estrangeira. Os turistas internacionais são normalmente roubados nos balneários brasileiros, isso não é novidade. Mas, no ano da Copa, o Brasil enlouqueceu e, como bem diria o Prof. Otto Bennar,"ficou caro antes de ficar rico". Penso que o começo de tudo foi na área imobiliária. Pelo menos em Garanhuns, não há quem compre um terreno, muito menos uma casa, nem das mais modestas. Izabel comentava lá na escola que o pai dela seria milhonário, caso não tivesse vendido uma casa que possuía na avenida Agamenon Magalhães. Os aluguéis estão pela hora da morte e qualquer apartamentinho custa 600 reais. Tá certo que eu pagava 350 Euros por um T0  em Portugal, o que equivalia a uns 900 reais em Garanhuns. Mas, ainda assim, é caro. Pelo menos, em Portugal o povo anda muito bem vestido com alguns Euros. Na veneza pernambucana, estava a procurar uma camisa para Tony trabalhar. Coisa simples, para usar com o terno, a fantasia de advogado. A mais acessível que encontrei custava a exorbitante soma de 230 Reais! Trouxemos umas parecidíssimas (e até melhores) produzidas no leste europeu que nos custaram 14 Euros! Se for procurar o mesmo produto, com marca famosa, a camisa passa a custar em torno de 450 Reais. É muito dinheiro. O comerciante anda meio sem noção dos valores.

Caro mesmo são os serviços. Como já vos disse, em Julho estivemos em Porto Seguro (Bahia) para um congresso. Num determinado restaurante, sentamos para comer uma moqueca de camarão. Pedi meia porção da moqueca e Luiza optou por um prato de esparguette. Resultou numa continha final de 105 Reais. Um verdadeiro absurdo. Vá que estava muito bom, mas, um quilo de camarão custa 50 Reais no Recife. À beira mar, deveria ser mais barato. Em Garanhuns, um almoço numa churrascaria pode custar por volta de 80 Reais. O mais caro é chegar lá: a tarifa de táxi não tem graça e o ônibus na nossa cidade é ruim e caro. Pagamos 2,00 do centro para a AESGA, no ônibus comum, que de um ponto ao outro não leva nem 5 minutos. No Recife, rodamos horas inteiras com o passe A e ainda tem direito a integração. Não faz o menor sentido.

Comprovando que essa carestia generalizada não é somente em Garanhuns ou na Bahia, os internautas do Rio de Janeiro criaram uma comunidade no Facebook denunciando os preços absurdos que se pratica no verão carioca, criando a moeda Surreal, numa alusão ao surrealismo de Salvador Dali. Vimos uma reportagem na Globo News que um picolé, desses que vendem  numa carrocinha no meio da rua, estava por 20 reais na praia! E era um picolezinho surrapa,  e nem Caicó era. Igualmente, em Maceió, na praia de Ponta Verde, um caldinho custa 6 Reais no sábado, e no domingo, sobre para 8 ou 10! Definitivamentee, o Brasil enlouqueceu. Nesta linha de educação do consumidor, o Canal do Otário, de onde tirei a foto do começo, também denuncia os preços abusivos e  aconselham ao consumidor: se é muito caro, não compre. O boicote aos preços abusivos pode render uma reflexão de quem oferece o produto, pois ainda vale a lei da oferta e da procura. No final das contas, o poder estar nas mãos do consumidor. Não é feio consultar os preços antes de comprar, e desistir da compra, caso estes não sejam adequados. Feio mesmo é calotear, não querer pagar depois que consumiu ou passar no cartão de crédito para depois criar uma avalanche financeira nas contas pessoais.  

É claro que não devemos nos agarrar ao dinheiro, economizando em vida, como Euricão engole cobra. Quem não se lembra de célebres personagens de novela como Nonô Correia ou D. Salomé? Ser apegado ao dinheiro e viver fazendo conta de centavos é uma tortura. Entretanto,  não faz sentido pagar tão caro por tão pouco, ou por serviços deficientes. Eu, por mim, valorizo o suor dos meus neurônios, e, se o serviço for muito caro nos dias normais (exceto nas viagens), não consumo. Ninguém morre por não ter uma camisa de marca, mas o comerciante quebra, se não vendê-la.

Até amanhã, fiquem com Deus.    

Um comentário:

  1. Falei sobre isso, recentemente, no Face. Passei uns dias em Tamandaré e, numa pizzaria, o cardápio estampava, sem constrangimento alguma, uma pizza portuguesa por 80 reais. Eu e Mirths levantamos e fomos comer um sanduba. Não me deixo extorquir, nunca. Sobre os preços de aluguel de imóveis que você citou: moro no bairro de Jardim São Paulo, um bom bairro. A média do aluguel por aqui é acima de mil reais. Eu, sou um sortudo, pago 450 no meu AP, um achado. Em Porto de Galinhas, certa vez, me cobraram 5 reais por um milho. Esbravejei: não sou turista! O preço caiu pra 3,50, mesmo assim ainda paguei mais do dobro do que normalmente pago perto de casa. Aja grana!

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