Estou com um grave problema: não consigo escolher bem as palavras para começar os textos. Talvez por isso os atrasos nos posts. Como tentativa de me organizar, voltarei a escrever estas mal traçadas linhas aos domingos pela manhã. Decisão tomada, a partir do meu último dia de folga das férias de verão de 2014, retomarei a rotina, determinada a ser mais disciplinada, largando de vez a procrastinação. Até já comecei a ler os artigos dos meus queridíssimos orientandos, a corrigir a tese (depois eu conto da terrível impressão de caos que causam as correções do senhor doutor meu orientador em parceria com a sua Thinker Bell acadêmica, que somente confirma que as baixinhas são implacáveis!), a providenciar as coisas de começo de ano, reservadas ao período de férias. Houve um tempo em que férias significava descanso. Hoje, tenho amplas dúvidas. Penso que descanso mesmo só na aposentadoria. Talvez tudo mude até eu chegar lá.
Confesso que há bem pouco tempo quando a conversa rodava e recaia sobre a aposentadoria, eu declarava enfática: "não vou me aposentar nunca. Vou morrer numa sala de aula e assombrar uma escola." O tempo cuidou em me ensinar o equívoco do meu plano imaturo. Nada é para sempre, e graças a Deus, como diria Marcelo Camelo "todo carnaval tem seu fim", e um dia chega a hora de pendurar as chuteiras. E passar para outra fase da vida, que pode sim ser muito produtiva, contrariando o comentário infeliz do então presidente Fernando Henrique Cardoso que classificava como vagabundos os trabalhadores que se aposentavam aos 50 anos. Com essa brincadeira, a idade mínima para aposentar-se no Brasil mudou e o critério principal deixou de ser tempo de serviço, que poderia ser comprovado com declarações, e o tempo de trabalho passou a ser contado pelo tempo de contribuição. Engraçado é que boa parte das reformas nas regras da aposentadoria, geralmente desfavoráveis ao trabalhador, foram capitaneadas pelo então presidente FHC que aposentou-se aos 37 anos. É o clássico "faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço". E as regras seguem mudando durante o tempo regulamentar, assustando os trabalhadores que estão mais próximos do apito final enquanto partícipes na população economicamente ativa. Vi no noticiário que até na França os ferroviários entraram em greve, motivados pelo aumento da idade limite para a reforma, passando de 60 para 65 anos.O Estado entende que um homem é perfeitamente capaz de conduzir um trem aos 65, já que a expectativa de vida naquele país já passa dos 70 anos. Já para os motoristas de caminhões, a licença para conduzir e exercer a profissão é válida até os 60 anos. Como o trabalhador pode completar o tempo mínimo de 65 anos, se não pode obter a licença para exercer sua profissão? Coisas estranhas produzidas por legislações pouco amadurecidas. O imediatismo de sanear o rombo das previdências originam esses monstrinhos trabalhistas.
Muitas pessoas temem a aposentadoria. Alguns, temem a desconstrução da identidade, uma vez que esta é construída através do trabalho. Outros, sofrem a perda de vantagens que não são incorporadas aos salários, que no momento da aposentadoria pode reduzir o rendimento em até 60%. Os oficiais de justiça são um exemplo desta situação. Neste cargo, ninguém se aposenta pois, caso o faça, irá perder mais da metade do salário. E como cumprir os compromissos com uma redução tão drástica? Por isso, continuam se arrastando vida a fora, até quando chegar o dia de fazer os mandados de Nosso Senhor. Há algumas profissões e condições sociais que mereciam condições especiais de aposentadoria. Professores da educação básica mereciam ter melhores condições para aposentadoria, pois,quando chegam à ela, já estão tão doentes e cansados que a aposentadoria é sinônimo de imensas contas na farmácia. Pais, e principalmente mães de crianças especiais, portadoras de algum transtorno mental deveriam ter uma redução no tempo de trabalho, pois a vida desse pessoal não é nada fácil.
Passei a ter um olhar positivo a aposentadoria quando Cândido e Neide aposentaram-se e não tornaram-se sócios de cadeiras de balanço. Ainda perdura no imaginário a representação do aposentado velho, com um gato no colo. Hoje, o new retired é uma pessoa produtiva, longe da classificação como inativo. O amigo Cícero Dimas fez suas contas e percebeu que solicitar a aposentadoria proporcional era muito mais adequado do que permanecer se matando numa sala de aula da educação básica no norte do Brasil. Encontrei-o semana passada, visitando a família, todo serelepe na sua nova condição de aposentado. Existe vida inteligente e produtiva após a aposentadoria, conforme o exemplo da minha querida Genésia Neri. Na nossa instituição enfrentamos alguns problemas administrativos para aposentadoria, e, os colegas temiam sair somente na "expulsória", que ocorre quando o servidor público completa 70 anos de idade. Genésia foi um divisor de águas. Depois dela vieram outros servidores administrativos,como Toinha que assinou os papeis nesta semana, e partilhou sua gratidão à Deus através do Facebook. Partilhamos a felicidade dela como nossa. Hoje, pela manhã, tive o prazer de encontra "seu" Manuel e "seu" Bira. Este último recém-aposentado, muito bem disposto, com um largo sorriso em sua cara indígena. Após cumprimentos, "seu" Bira me perguntou: "Sabia que eu mudei de nome? Agora eu sou o Jaque!" Entre risadas, esperei a explicação: "É que, como estou aposentado, todo mundo chega pra mim e diz: 'já que tu estás aposentado, vai lá na cidade e paga isso para mim', ou 'Já que tu estás em casa, faz isso pra mim'. Seu Bira é ótimo. Família é uma trabalhadeira que nunca termina. Mas à medida correta, é uma ocupação boa. Passou da conta é exploração. Cada um cuide de sua vida, que o aposentado também tem muito o que fazer, nem que seja para pegar um autocarro de graça para tomar um café e jogar conversa fora, enquanto os jovens trabalhadores apressados jogam-lhes olhares esperançosos de "um dia eu chego lá".
Até amanhã, fiquem com Deus.
Nenhum comentário:
Postar um comentário