terça-feira, 29 de novembro de 2011

A vida na escola e a escola da vida

Esse é o título de um livrinho muito bonitinho que li há alguns (muuuuuuitos) anos quando fazia Graduação em Geografia na UPE. Na realidade, comprei o livro de Cláudio Ceccon, Miguel e Rosiska Oliveira por conter umas ilustrações ótimas, para companhar um texto muito simplificado sobre o cotidiano dos nossos alunos da escola pública. Guardo o livrinho com carinho até hoje, um dos primeiros que comprei a Carlos, o livreiro da UPE. O livro ainda está lá nos guardados brasileiros.
Semana passada Luiza completou oito anos. E como os amigos dela resumem-se aos companheiros de sala, pois cá no prédio tem apenas um bebê, e nossos companheiros da UA ou não tem filhos ou são pais de bebezinhos, a festinha foi na escola mesmo. Desde o Diocesano que as festas tem acontecido na escola, pois é mais simples: os meninos lá já estão, não compromete o exíguo tempo dos pais em leva-los de lá para cá, e não há nenhum problema se não levar presente. Aliás, na Escola da Glória há algumas regras que necessitamos atender para poder oferecer o lanche na escola. É para levar somente o bolo e os sumos. Nada de salgadinhos e docinhos. Refrigerante não pode. Ainda assim, os miúdos se divertem muito. Como na quinta-feira foi o dia da greve, a comemoração ficou para a sexta. Faltando um quarto para as três (é assim que se diz as horas aqui, façam a conta! Só me lembro de Rocir Santiago na Sete Colinas!), cheguei à sala com o carrinho rosa pink e um bolo de chocolate, que comprei no supermercado, lógico. Os meninos ainda terminavam as atividades de matemática, com uma colega no quadro lutando com uma subtração. Várias mãos levantadas chamavam atenção da professora, oferecendo-se ao socorro da coleca confusa. Entrei discretamente quanto o possível numa sala composta por 25 crianças na faixa de 8-9 anos.

Terminada a atividade, a professora pediu que os meninos arrumassem o material que deveria ser guardado nas gavetas do armário, próximo onde eu estava. Para conferir se o material está recolhido, os miúdos devem segurar a pilha de livros e cadernos sobre a cabeça, sinal de que estão prontos.

Guardados os materiais ordeiramente, colocamos o bolo na bancada à frente, enquanto eu abria as embalagens dos pratos, copos e garfos, a professora perguntava aos meninos quais os ingredientes de um bolo e revisavam os tipos de texto. Para dividir o bolo, ela explicou frações simples: um meio, um quarto, quatro quartos. O Parabéns à você foi ótimo. Eles cantam aquela parte "Com quem será, com quem será que a Luiza vai casar?" E como sempre, meninas nessa idade já tem suas paixões, e a paixonite de Luiza por Bruno é conhecida no grupo. Mulheres passam a vida apaixonadas e nessa idade, quase sempre não são correspondidas.


Luiza, Cátia e Carmo distribuiram o bolo e eu fiquei servindo Ice tea de Pêssego e de Manga à criançada. No final, cometi a minha transgressão à ordem, tipicamente brasileira, sob o olhar divertido da professora: levei um saco de 1 kg de balas para dividir com aquele povo lindo. Uma festa de rebuçados (balas), caramelos e chupa-chupas (pirulitos). Felicidade em todos os rostos. Simples assim.
Além do carinho dos colegas pela minha pequena, fiquei muito bem impressionada com a apropriação da situação pela professora. Contextualizou o bolo em português e matemática, revisando conteúdos trabalhados, com desenvoltura e muita graça. Puri é uma professora com muitos anos de experiência, que apoia-se na multiculturalidade comum nas salas de aulas portuguesas para ampliar os horizontes do pequenos. Outro dia, ela pediu que os meninos escrevessem a ementa do jantar da noite anterior. Por coincidência, era a nossa noite do cuscuz. Luiza escreveu em uma folha de A4 dobrada ao meio imitando um cardápio de restaurante, enfeitada com desenhos que ela arranjou na web: cuscuz, leite, café, pão, queijo flamengo, fiambre (o presunto brasileiro) e frutas. Na hora de apresentar para a malta (turma), surgiu a dúvida: O que é cuscuz? Uma colega arriscou: "é uma fruta!", a outra disse: "e um tipo de salada!", o outro emendou: "Nada disso, é um purê!" A Professora explicou que era uma espécie de bolo de trigo. Luiza corrigiu: "É um bolo de milho que se come com leite." E todos aprenderam sobre a culinária nordestina.   
É uma professora fantástica. Pena que provavelmente irá à reforma (aposentar-se) no próximo ano, pois, do jeito que as coisas vão, os professores que já completaram o tempo de serviço temem perder os direitos conquistados por anos a fio de trabalho. Seria muito bom que a tivessemos no proximo período letivo, fechando o ciclo no 4º ano. É esperar para ver.

Este texto me trouxe uma lembrança carinhosa da minha mãe que me dizia, com o ar de riso: "Tu é  professora nada, Anninha. Professora são estas que ensinam os meninos a ler. À gente grande não se ensina, pois eles só aprendem o que querem." Sabia das coisas, minha velha. Aprendeu na escola da vida.  

Té amanhã, fiquem com Deus. 

  

2 comentários:

  1. Vovozinha linda sabia o que dizia... linda, linda, saudades sem fim... adorei o post, me fez lembrar minha infância de paixonites não correspondidas e de nunca ter tido festinha de niver na escola por causa das férias! saudades gigantes de vcs duas! bjokas!! Mayda

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  2. Linda, essa professora. Todas as professoras deveriam ser como a Puri, tão sábia na sua simplicidade em ensinar. Beijos Para Luiza e para você.

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