domingo, 28 de junho de 2015

Leituras e reflexões: A menina que não sabia ler

Djavan é um rapaz sabido: "Um dia frio, um bom lugar pra ler um livro..." Estamos, portanto, na melhor época para as leituras. Eu, particularmente, tenho o vício adquirido há anos de ler na cama. Por isso que nunca me adaptei a leitura em dispositivos eletrônicos e ler na telinha do computador para mim não representa leitura de lazer. É compromisso profissional. Portanto, sou adepta do livro impresso, sem essas fantasias com cheiros ou formas. Ler na cama só é ruim quando o livro é muito longo, daí pesa na mão. Ainda não encontrei um suporte que me ajude a aliviar a dor discreta no pulso. Talvez, eu mesma invente alguma coisa que provavelmente algum asiático já inventou. 
Pronto, então, nesses dias cinzentos de chove-e-para, tenho lido muitas coisas. Aliado ao nosso inverninho ameno, tenho lido mais porque a televisão mudou-se para o quarto de Luiza durante as férias de janeiro e nunca mais voltou. O pequeno aparelho de 14 polegadas tem seu lugar na nossa história. Tony ganhou-o num bingo em 1997, e o danadinho só foi uma vez ao conserto, na época que tivemos uma empregada louca, que quebrava tudo. O problema é que a tvzinha é analógica, só capta o sinal local, e nem sei até quando isso será possível. Quando refizemos o nosso contrato com a TV por assinatura, Tony arranjou um receptor extra, que instalou no nosso quarto. Mas, a tvzinha não tem entradas USB adequadas ao aparelho, de forma que será necessário comprar uma tv moderna. Por mim, ela não me faz falta. Tenho até aproveitado melhor o pouco tempo livre com leituras de todos os tipos. Caiu em minha mão, se for livro, eu leio. Só ainda não consegui ler aquele livro de Nélida Piñon que comprei num sebo há vários anos. Já voltei a ele várias vezes e sempre desisto no mesmo lugar. Reconheço o imenso valor da escritora, mas, infelizmente, não cruzou com o meu santo. Talvez, o problema seja porque ela diserta sobre o sentimento da personagem, e eu prefiro fatos. Ando meio seu paciência para metáforas, contudo, ainda voltarei a obra, pois nenhum livro me venceu, exceto "O jogo das contas de vidro" de Herman Hesse. Ruim, sem comentários.
Quando fiquei sem nada para ler, fui ver a estante de Luiza. Depois de gargalhar com O Diário de um Banana, saquei da prateleira "A menina que não sabia ler", de John Harding. O interesse pelo livro foi despertado pela professora de Português da escola, que, ao trabalhar gêneros literários, levou a sinopse desse livro. Luiza ficou interessadíssima, e quase consome o meu juízo por este livro. Mandava-me bilhetes, recados nas redes sociais e no telefone. Pedi que pesquisasse onde encontrar e quanto custava. Depois de fazer um acordo literário, em que ela deveria terminar pelo menos o primeiro capítulo do livro que estava lendo,  acabamos decidindo por uma versão usada através do site Estante Virtual, cuja diferença de preço foi de mais ou menos dez reais. Depois de concluir o tal livro anterior, ela jogou-se na obra e às vezes, no caminho da escola, contava-nos trechos da leitura. Me interessei e coloquei na fila.
O livro publicado pela Leya em 2010, relata a história de família de Florence e Giles, meio irmãos, que residiam num casarão sombrio na Nova Inglaterra. Na verdade, a narrativa é construída através da visão da menina, que, aos 12 anos, aprendeu a ler sozinha para escapar da solidão numa biblioteca imensa e repleta de obras importantes. Enquanto o seu irmãozinho foi enviado para a escola, a pré-adolescente criava uma rotina de leituras, escondida da governanta, que tinha ordens expressas do seu tio para não alfabetiza-la, pois, na sua visão e na concepção da época, mulheres não precisavam saber ler, e os livros poderiam ser perigosos para desvirtuar o comportamento feminino. Por não conseguir adaptar-se ao mundo escolar, Giles retorna para casa, e o tio, que nunca aparece ordena que o menino seja educado por uma preceptora. A primeira professora, a Sra. Whitaker,morre afogada no lago da propriedade. Logo após, é contratada uma nova professora. A misteriosa Sra. Taylor parece ter algo de sobrenatural e coisas estranhas começam a acontecer na casa. Tudo corre razoavelmente bem, até que Florence descobre nos pertences da professora duas passagens para Europa, uma delas no nome do seu irmão. Para evitar que a professora leve o seu irmãozinho, Florence é capaz de tudo.
O livro é bastante interessante e a história é muito bem desenvolvida. O autor descreve a personalidade da menina, através de suas ideias inovadoras. Ela é cativante, meiga, inteligente como qualquer pré-adolescente. Contudo, lá pela metade do livro, há um sinal de alerta: a danada da menina consegue convencer o irmão a fingir uma dor de dentes, pois, terão que ir à cidade consultar o dentista. Dessa forma, ela poderia ir à delegacia conversar com o xerife sobre a terrível Sra. Taylor. Pois, o menino começa a fingir e o plano é bem sucedido: ela corre para a delegacia, faz a denúncia e ao voltar para o consultório, encontra o irmão pequeno sendo carregado para a carruagem. O dentista, sem saber qual o dente doía, arrancou os molares do menino. Ela nem esboça arrependimento, justificando para ele e para si mesma que eram dentes de leite.
No término da obra, fiquei a pensar se há pessoas que são naturalmente más. Andei até conversando com Izabel, na hora do lanche. Ela, nos explicou uma série de patologias emocionais que podem desembocar num comportamento frio, desprovido de emoções. Rosa e Ricardo contribuíram com a visão, respectivamente, pedagógica e sociológica da questão. Vê-se que sou uma pessoa privilegiada por acompanhar uma boa discussão multidisciplinar para entender um personagem literário.  E, mesmo sem chegar a nenhuma conclusão, penso que é possível a criatura ter mesmo uma ruindade estrutural. Há crianças que são manipuladoras, que controlam os adultos, e eles nem se dão conta disso. Quando trabalhava na educação básica tive dois ou três alunos assim: são quase sempre muito inteligentes, agradáveis, mas, há alguma coisa neles que faz nos sentirmos mal.
Luiza ficou um tempo com medo do livro, pois há alguns trechos de mal assombrados, depois perfeitamente explicadas pelo autor. Até parou de ler por uns dias, e depois não resistiu e voltou. Somente quando eu comecei a lê-lo é que ela confessou que ficou assustada, mas, que daria um excelente filme. E eu fiquei com dúvidas se este é realmente um livro para pré-adolescentes.

Até amanhã, fiquem com Deus.         

Nenhum comentário:

Postar um comentário