sábado, 1 de dezembro de 2012

Digam-lhe que fui ali: Tomar - Parte I


Igreja de Santa Águeda e S. João Batista
Desde que lemos  "1822", livro do Laurentino Gomes que ficamos curiosos a respeito de Tomar. Antes dessa leitura só tinha ouvido falar dessa cidade, uma das regiões mais antigas da península ibérica em duas ocasiões: primeiro, porque é a cidade onde mora a Rosa Brígida, colega que ingressou também tardiamente no doutoramento e, como eu, passou também por maus pedaços. Depois, porque na semana que cheguei em finais de novembro de 2010 houve um vendaval na região que causou grandes estragos na região. As construções novas sofreram bastante, muitas árvores foram arrancadas do solo, carros varridos pelo vento forte como se fossem brinquedo de criança. Mas, as construções antigas não sofreram qualquer abalo. Até mesmo em Aveiro, os ventos fortes causaram estranheza, principalmente para uma recém chegada sem família, instalada numa água furtada de um prédio antigo. Pensei que o pequeno apartamento iria levantar voo! Em Tomar, quando se diz "antigo" é realmente do passado. Algumas construções são de 1160. Uma data!
Rua da Sinagoga
Então, mesmo antes de Tony chegar, programamos a visita a esta cidade, localizada na região de Santarém, à 191 km de Aveiro.  Escolhemos o aniversário de 9 anos de Luiza, pois ela adora conhecer cidades e pernoitar em hotéis. Reservas feitas, roteiro programado, era só esperar o dia chegar. Na sexta-feira, as coisas começaram a ficar estranhas: o céu nublou e a temperatura caiu um bocado. Mesmo assim, nos ajeitamos e no sábado pela manhã, a chuva nos esperava no caminho da estação dos comboios. Mas, nessa época, chuva é comum, quem sabe lá não está um solzão? Na hora de comprar os bilhetes, comecei a entender porque a colega Rosa reclamava tanto quando tinha que vir a Aveiro à troco de nada. Para chegar em Tomar é preciso tomar um comboio até Entroncamento ou Coimbra B. De lá, pega outro trem para a cidade dos templários. Isso implica em algumas demoras e esperas. Mas, íamos a passeio, era o aniversário de Luiza, tudo era festa. Só que quando chegamos a Entroncamento, a estação estava fechada, pois 24 de novembro é dia de greve dos comboios. Sei disso desde que cheguei em terras lusitanas, mas dessa vez, fizeram uma greve geral no dia 14, não vimos nada na TV acerca dessa parada tradicional. Resultado: para não ficar parados num lugarzinho no meio do nada, pagamos 25 euros de táxi, sob uma chuva fininha e insistente. No caminho, o idoso condutor nos dizia que Tomar é uma cidade muito bonita, mas que no inverno é muito fria e úmida. Para ele, o ideal era uma poltrona, uma lareira, um bom vinho e um jogo de futebol na tv. Não desanimamos mesmo ao chegar no hotel, sob a mesma chuva que deixamos Aveiro. Check in feito, com o mapa que a recepcionista nos deu, passamos numa lojinha chinesa e compramos 3 guarda chuvas bem fraquinhos. A chinesinha escapou durante o final de semana a vender capas de chuva e sombrinhas aos visitantes mais valentes! Como já era tarde, fomos ao almoço.
Na Tasquinha da Mitas, restaurante tradicional cuja especialidade era moelas (guisadas, fritas, espetadas, estufadas, de todo jeito!), deixei Luiza escolher o prato. Ela pediu uma picanha, Tony um bitoque (espécie de bife amaciado) de vaca. Para esperar, trouxeram-nos a entrada: pães, azeitonas com molho de ervas e patês industrializados. Eu pedi uma canja de galinha, que dessa vez, apesar de feia, era gostosa. O almoço demorou, enquanto meus acompanhantes lindos bebericavam coca-cola e eu sorvia minha canja, chegavam outros comensais, ingleses em sua maioria. Engraçado, alguns deles encontramos novamente na visita aos momumentos, eles não estavam nem ai com a chuva que nos torturava.  Ingleses tem couro de jacaré! O almoço esteve delicioso, o rapaz que nos atendeu errou a conta, Tony pediu para corrigir pois faltava um refrigerante. Tudo custou 23,80.
Monumento à fundação (1160)
Sombrinhas em punho, fomos ver a cidade sob a chuvinha, que durante o caminho se tornou uma chuvarada. Chegamos ao pátio da República, visitamos o monumento à fundação, datado de 1160, cuja figura imortalizada em cobre é um cavaleiro de escudo e espada. Olhando através do cavaleiro, visualizamos o Convento de Cristo e o Palácio dos Templários. É, esta cidade foi uma importante sede da Ordem dos Cavaleiros de Cristo, os Templários, mundialmente famosos após o estrondoso sucesso da obra de Dan Brown, "O código Da Vinci". Além disso, os laços entre Tomar e o Brasil são históricos. Segundo Laourentino Gomes, foi daqui que saiu o financiamento para a "independência" do Brasil, no século XIX. A maçonaria pernambucana é originada de lojas de Tomar. Ai foi que comecei a dar risada, me lembrando de Paulo Falcão, que faz parte da maçonaria, a quem trato carinhosamente de "meu irmãozinho de loja". Quando as pessoas perguntam se estou doida, pois não há mulheres na maçonaria, explicamos entre risos, que somos irmãos de shopping center. Paulo é uma graça. Entramos na Igreja de Santa Águeda e S. João Batista, com suas cortinas brocadas na porta de entrada e lindos vasinhos com crisântemos nas calçadas. Enquanto Tony apreciava o teto abobadado, Luiza me puxou para um nicho onde acendiam velas. Nesta Igrejas mais antigas, não há chamas, mas uma mesinha eletrônica, onde o fiel insere moedas compatíveis com o número de lâmpadas que deseja acender. Olhamos mesinha de Santa Águeda, cada "vela" custava 0,30. Do outro lado havia a de S. João Batista. Cada luz acendia por 0,10. Preferi o modo econômico, pois o santo estava em promoção, e acendemos três velas pelo preço de uma. Leis de mercado, meu filho! em tempos de crise, a Santa que me perdoe, mas a prece dela estava muito inflacionada.
Depois da Igreja, a Sinagoga. Em Tomar, temos a Sinagoga mais antiga de Portugal. Numa ruazinha de pedras bem polidas por muitos pés, cujas casinhas tem portinhas baixas, nas quais eu obviamente consigo passar sem me curvar, com Tony zuando da minha estatura, encontramos a Sinagoga. Dominada pelas 4 colunas, a responsável pelo lugar nos explica que representam as 4 matriarcas de Israel, pois o judaismo é uma religião essencialmente matriarcal, uma novidade para mim, que só via o culto pelo lado masculino. Ela nos explica que a acústica perfeita do lugar é conseguida às custas da instalação de bilhas (jarros) de cerâmica nos cantos do teto.  De cabeça para baixo, o som entra nas jarras e é ampliado. Até  nossos passos de tênis reverberam no salão. Conhecemos os paramentos do culto judaico, enquanto a curadora nos explicava que, como em Tomar só há duas famílias judias, e não tem 10 homens, não há cultos nesta Sinagoga, só quando recebem grupos. Curiosamente, o último culto decorreu há 15 dias, quando um grupo do Recife esteve por essas paragens.
Parque Mouchão, com o gramado coberto por folhas amarelas
Na saída da Sinagoga, a chuva deu uma trégua e fomos ao Parque Mouchão, lindíssimo espaço às margens do Rio Nabão, que por semelhança ficamos chamando de "Rio Babão", um gato velho que tinha na casa de Tony quando comecei a andar lá nos Ferreira! Atravessando a ponte velha, vimos um fumaceiro imenso do outro lado do rio. A chuva voltou forte e seguimos a nuvem que mais parecia um incêndio, pois em Portugal onde há fumo (fumaça) há castanhas assadinhas na hora. Uma delícia que Luiza descasca, mas não come. Entramos numa pastelaria e pedimos café. Tony  pediu uns biscoitos com aspecto duvidoso, fiquei calada. Luiza, pediu um pão com chouriço, que veio quase sem chouriço. Salvaram-se o café, a coca cola e as castanhas quentes.  A chuva não dava trégua, voltamos para o Hotel por volta das 17h30, quase à noite.
Parque Mouchão, com a trégua da chuva
Assistimos noticiários, onde fomos informados que haveria temporais por todo final de semana e  em todo país. A Madeira e os Açores estavam em alerta vermelho, com risco de inundações. O jeito era enfrentar as tempestades, rezando que no outro dia, o tempo melhorasse para subirmos a serra para visitar o Convento de Cristo, lá onde se escondiam (bem escondidos) os Cavaleiros de Cristo. No final de noite, quando Luiza começou a acusar fome, saimos com nossas sombrinhas em busca de um lugar para jantar. Nas nossas andanças diurnas, havia visto um elegante ristorante italiano. Na janela da frente, um pizzaolo preparava uma pizza de massa fininha. Entramos no La Bella. O lugar era chique, com uma iluminação belíssima. O maitre nos atendeu pessoalmente, com muita presteza. A vantagem de ser turista é que você entra nos lugares parecendo um bicho de tênis e ninguém ignora. O meu Master tem o mesmo poder de fogo do cartão da mulher engomada da mesa vizinha. Nesse aspecto, o empresário dos serviços turisticos de Portugal são altamente evoluídos. Fiquei pensando em um lugar que lhe destrata porque está de sandálias ou por ser uma mulher sozinha com uma criança... Lamentáveis, esses casos recorrentes em Garanhuns. Falta muito para nós, ainda.  Pedimos calsones de piperonne e cogumelos, com sorvetes de chocolate, para Luiza e, morango para mim. Dessa vez tive cuidado de perguntar o tamanho das porções para não pagar o mesmo mico que  paguei em Viseu. Tony preferiu um café expresso. Apesar de todo requinte do ambiente, pagamos 18,80.
Ponte sbre o Rio Nabão
Voltamos pulando as poças de água acumuladas pela chuva forte que caía. No nosso quartinho do hotel, o aquecedor nos esperava, deixando o ambiente quentinho, ideal para uma boa noite de sono. Luiza instalou-se na pequena cama extra ao pé da minha, e abraçada a  Cátia (a ovelha de peluche)  dizendo que aquele tinha sido o seu melhor aniversário. Ouvindo a chuva tamborilar na janela, desejei que o tempo estivesse seco no outro dia. Mas, se chover, damos um jeito de ser divertido assim mesmo.
Até amanhã, fiquem com Deus.

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