domingo, 17 de novembro de 2013

Pobres e sujos. Ricos e poluidores.

Aproveitando o final de semana prolongado, juntamos nossas coisas e fomos em busca do sol na capital pernambucana. Para falar a verdade, havíamos marcado essa fugidinha de final de semana com feriado para o dia 28 de outubro, quando se comemora o dia do servidor público. Mas, Tony estava na pendência de inscrever-se no concurso da AESGA. Acabamos por desmarcar, prorrogando o passeio para o dia 15 de novembro. Em Garanhuns, neste feriado só há duas opções: 1) desfile de aniversário do Colégio XV, que só ocorre a cada cinco ou dez anos. 2) Caminhada da Mãe Rainha, saindo às 6 da manhã, da matriz de São Sebastião, totalizando uns cinco quilômetros de subidinhas básicas na cidade das sete colinas. Além de ser muito cedo, e sermos todos acordados pelos fogos de artifício do Padre Emerson, minha devoção não chega a tanto. Gosto de ritos religiosos e romarias, mas só de ficar olhando o povo passar. Ir atrás, nem do trio elétrico. Bom, no final das contas, Tony não se inscreveu no concurso e acabamos mesmo viajando na sexta feira. 

Apesar de toda muvuca, gosto de ir ao Recife. É uma capital interessante, com todas os atrativos oferecidos por qualquer grande cidade do mundo: bons restaurantes, boas opções de lazer, bons centros de compra. Com dinheiro na conta e um bom cartão de crédito, o Recife é um bom passeio. Frisando o que eu disse: um bom passeio. Na minha singela opinião é um lugar para chegar, curtir e voltar para casa. Até porque o Recife padece de mazelas urbanas que a cada dia se tornam, para mim, mais graves. Nestes dias, estive duas vezes na cidade, localizada a 230 km de Garanhuns. No dia 07, fui a um seminário sobre as CPAs (Comissão Própria de Avaliação). O assunto é meio cascudo (avaliação do ensino superior no Brasil), mas, estava disponível para aprender uma coisinha diferente. Além disso, a companhia era boa: Izabel, Rosa, Gabriela, Virgínia e Ricardo são excelentes colegas de trabalho. Contudo, no meio do caminho tinha um ar condicionado ligado a todo vapor e os choques de temperatura me fizeram adoecer. Voltei antes do esperado, com uma faringite feroz. Recuperada, voltei nestes dias, agora em missão de lazer. Nas duas ocasiões ficou-me patente que os recifenses vivem dentro do lixo. Literalmente.

O Seminário foi no salão nobre da UFRPE.  Como tive que sair antes do término do evento, com a garganta arranhando e um fio de voz, fiquei lá pela frente a esperar um ônibus Barro-Macaxeira (via Várzea). O coletivo me deixaria na integração. Lá tomaria o metrô na estação do Barro para o TIP. Operação fácil, já havia feito isso um milhão de vezes, no tempo em que andei pelas UF do Recife. Mas, o hábito faz a prática, e eu me desacostumei a enfrentar o mata-mata dos ônibus Recifenses e seus motoristas voadores. Depois de esperar mais de 40 minutos, rodeada de cães, que os estudantes e comerciantes nem mais percebem e nem se incomodam com os bichos, o ônibus chegou lotadíssimo. O jeito era ir se equilibrando no coletivo até as imediações da CEASA, mais da metade do caminho. Na paragem do Barro, a multidão apressada tomou a estação onde é possível pegar conduções para os pontos mais escondidos do Recife. A reforma reduziu ainda mais o espaço, e a multidão acotovelava-se para encontrar o seu transporte. Já eram quase seis da noite, e todos queriam partir ao mesmo tempo. Consegui chegar na plataforma e apanhar um metrô superlotado, com Adele a gritar "someone like yooooou!!!!" de algum telemóvel. Estes pequenos aparelhos têm som bem potente. Enquanto isso, uma mulher reclamava que tinha sido assediada por um tarado desde a Estação do Recife. As amigas da senhora tentavam apaziguar e tranquiliza-la, dizendo que o sujeito havia descido naquela estação, enquanto as outras solidarizavam-se com a vítima, cada partilhando sua experiência. E os homens ao redor, olhavam disfarçadamente para o teto ou para as  mãos, envergonhados por poderem ser confundidos com molestadores de metrô lotado. Cheguei meio morta e meio viva na rodoviária e apanhei o ônibus para Garanhuns. Dei graças a Deus por ter estudado e por todas as oportunidades que o destino me deu para que aquela não fosse a minha rotina. 

Neste final de semana, a coisa foi diferente. Fomos a passeio, nos hospedamos em um bom hotel, de preço acessível. Ficamos em Boa Viagem, bairro turístico da cidade, situado a poucos metros da orla. Neste lado da cidade, as ruas são limpas, as avenidas são largas, muito bem sinalizadas e iluminadas. As diferenças sociais dão as caras nos vendedores ambulantes de tudo, ou na prostituição ostensiva ao cair da noite na Conselheiro Aguiar. Apesar dos tubarões - os do mar e os do asfalto - o turismo fervilha na orla. Não podemos dizer que há uma divisão democrática do espaço, pois, os serviços infraestruturais que dispomos aqui, rareiam a medida em que nos aproximamos do centro da cidade, que como em toda grande cidade, vive um momento de grande decadência. O lixo é a expressão mais gritante da falta de educação. Sobras de frutas, papéis, plásticos, e toda a sorte de material descartado voam pelas calçadas e amontoam-se nas bermas das calçadas. Os vendedores apregoam seus produtos através de megafones, aumentando a poluição sonora, engrossando a turba promovida pelos vendedores de cds piratas, que reproduzem funks de baixíssima qualidade em alto e  péssimo som. Ambulantes vendem água, frutas, salgados oleosos e peixes secos, que exalam um fedor insuportável. Os transeuntes passam apressados nas calçadas, agarrados as suas bolsas, com olhares desconfiados. O povo fala aos berros e dão encontrões nos desavisados que vem em sentido contrário. Não é preconceito, isto é o centro do Recife. Inventei de ir mostrar a Luiza alguns locais históricos, importantes para que ela compreendesse melhor a Confederação do Equador. Fomos a Casa da Cultura, que abrigou a Casa de Detenção do Recife nos tempos de Frei Caneca. Felizmente, o lixo concentra-se para além das grades que cercam o jardim da edificação histórica. Lá dentro, aproveitamos bem o espaço bem conservado. Pensei em ir ao Forte das Cinco Pontas, mas, o trânsito do sábado pela manhã estava impossível. Para agravar a situação, entramos numa ruazinha errada e fomos acabar na rua da Concórdia, onde tudo está em péssimo estado de conservação. Nem a Rua Preta, em Caruaru, em seus piores dias, teve tão ruim aspecto. Saímos correndo, na medida do possível pelo trânsito atravancado, e esbaforidos pelo calor, só mostrei a Luiza do Forte onde Frei Caneca foi executado pela janela do carro mesmo. No meio do caminho de volta, vimos uma entradinha para o Shopping RioMar, e o ar condicionado do centro de compras recém inaugurado nos foi mais convidativo do que o patrimônio histórico lamentavelmente mal cuidado.

Por mais boa vontade que tenhamos, é difícil transitar numa cidade neste estado. Não só a população de Recife, mas, o povo Pernambucano deve se unir e cobrar providências dos gestores. Além disso, precisamos duma boa dose de vergonha na cara e de educação. E isso independe da classe social, pois ainda hoje mesmo, vi uma dona abrir um vidro (provavelmente blindado) de um Audi prata, chiquérrimo e jogar, sem a menor cerimônia, uma lata de refrigerante na rua. Será que ela faz isso na casa dela? Ou o compromisso com o bem estar coletivo é um compromisso apenas de quem anda pela calçada? Na pior das hipóteses, na primeira chuva, essa dona vai ficar presa num congestionamento, e talvez, enfrente até um alagamento, comum na Veneza brasileira, por conta do lixo que acumula-se nos bueiros por onde a água das chuvas torrenciais deveria escoar. Talvez a lata de refrigerante diga-lhe um "oi!"

Lamentável, Recife. E nem adianta dizer que foi "o Geraldo que fez". Cada um, seja pobre e sujo, ou rico e poluidor, precisa, urgentemente mudar de conduta e ser mais responsável por sua cidade. Pelo bem de Pernambuco.

Até amanhã, fiquem com Deus,

PS: O título do post é uma alusão - e homenagem - a um documentário que assisti há alguns anos na TV Escola,  dirigido por Alberto Flaksman, em 2000. Infelizmente, não achei-o para partilhar. Quem localizar, me diga!

5 comentários:

  1. “Recife é um bom passeio. Frisando o que eu disse: um bom passeio. Na minha singela opinião é um lugar para chegar, curtir e voltar para casa”. Olhe, menina, como eu discordo de ti, não trocaria o Recife por cidade nenhuma, mas enxergo a cidade de uma maneira diferente. Bairrismos (rsss) à parte, vamos aos comentários. Andasse de metrô ouvindo Adele? Sorte, muuita sorte, normalmente rola Sheldon, Kitara, Tiaguinho. Se andou de metrô passou em frente a minha casa, moro ao lado da Estação Werneck, de frente pros trilhos. Andei bastante no Barro-Macaxeira – que um amigo carioca chamava de argila aipim – e tenho tristes lembranças desse coletivo. O transporte coletivo do Recife é realmente caótico. Quanto ao lixo, é realmente um problema com origem na falta, total, de educação do povo. Portanto, a culpa não é da cidade, é do povo, é do Geraldo. Quando vier ao Recife de novo me fala, dar-te-ei um roteiro menos sofrível. rrsssss

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  2. Vivi um bom tempo em Recife no final dos anos 1970. Hoje, infelizmente, não tenho mais vontade nem de ir a passeio. Um caos!

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  3. Vivi um bom tempo em Recife no final dos anos 1970. Hoje, infelizmente, não tenho mais vontade nem de ir a passeio. Um caos!

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  4. Vivi um bom tempo em Recife no final dos anos 1970. Hoje, infelizmente, não tenho mais vontade nem de ir a passeio. Um caos!

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  5. eu gosto muito de Recife, não é a toa que moro aqui ha mais de 20 anos! Sei que temos muitos problemas estruturais como transito, transporte e desorganização no centro! Sabemos que parte desse problema ocorre por pura falta de civilidade! Mas, quando falamos em entretenimento ganhamos de 1000 a 0 para outras cidades do nordeste! Viva Recife!

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