segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

Veredas


Então, desde dezembro de 2020, um ano atípico na história recente da humanidade, me flagrei pensando nesse "pedaço de papel eletrônico". Fazendo um exame mais detido, reconheço, estive perdida. A uma certa altura, não sei bem que caminho peguei, em que viela me meti, em que sertão me embrenhei. Me vi em meio a uma repetição de rotas, em colisão comigo mesma. Nunca soube porque parei. Se perguntar a Matheus, tenho absoluta certeza que ele vai responder: "terapia". Por conta própria, como quem toma remédio, decidi refazer alguns caminhos. E para isso, tive que voltar aos sertões. Nesses tempos em que perambular por aí é proibido, poderia ter tomado a via documental de Euclides da Cunha. Preferi pegar na mão de Guimarães Rosa e me embrenhar nas veredas em busca de um caminho só meu. 

Nem preciso me demorar muito em apresentar a obra. Todos que minimamente prestaram atenção nas aulas de literatura sabem que "Grande Sertão: Veredas" é um clássico da literatura brasileira. Portanto, permitam que conte a minha história com esse livro. Publicado em 1956, a obra aborda a dinâmica social das Gerais, nomeadamente das Minas Gerais e da Bahia. Numa descrição impecável do quadro natural  e social, é possível percorrer através dessa leitura, os chapadões, os buritizais, os rasos e as veredas. Através da prosa de Riobaldo, que relata ao "doutor" a sua trajetória como jagunço, destacando o percurso dos chefes, como Zé Bebelo, Medeiro Vaz e Joca Ramiro, alinhavados por uma história de um amor mal conseguido.  

Conheci esse universo em 1985, através de uma minissérie produzida pela Rede Globo, tendo Tony Ramos e Bruna Lombardi como protagonistas. Na época, tinha 12 anos. Três anos depois, Ilma trouxe o livro da biblioteca do SESC. Li num só fôlego. 35 anos depois, buscando referências para reconhecer o meu percurso pessoal, decidi ler esse livro novamente. Busquei nalgum sebo virtual. Mandaram-me um exemplar embrulhado em papel pardo. Coloquei na minha "fila de leitura" e no mês de Dezembro,  entrei nos buritizais dessa leitura, quase numa cartase. Já ao final da leitura, sonhei três noites seguidas, sendo eu Tatarana e, Diadorim, pessoa conhecida. Tudo ao contrário, como quem olha pelo espelho. Vi pegadas novas no mesmo texto e chorei nas mesmas páginas finais. 

Encontrei uma vereda para voltar e refazer uma parte do caminho, pois, apressada que estava em somente passar, não me deixei observar. Para quem apenas ver, o sertão dessa vida é todo igual. É preciso olhar para perceber que "O sertão não é malino, nem caridoso, mano ó mano. Ele tira ou dar. Ele agrada ou amarga ao senhor conforme o senhor mesmo" (p. 537). Mesmo sabendo que "viver é perigoso", perdi a pressa. A marcha do meu passo é suficiente para tanger meu destino, definitivamente entrelaçado com esse livro. 

Feliz em voltar para essa vereda digital.
Fiquem com Deus ao som de "O pedido", do mestre Elomar, com Elba Ramalho (1981).

 

 

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