domingo, 8 de março de 2015

Dor de barriga não dá só uma vez

E ontem fizemos um almocinho para comemorar o aniversário de Ilma. De todas nós (e olhe que somos sete!) considero que ela é a melhor. Uma pessoa formidável, generosa, divertida. Sempre disposta a ajudar, tudo que assume para fazer, faz bem direito. Extremamente talentosa. Uma vez, vinha com ela no ônibus. Junto havia uma senhora vestida num lindo casaco de tricô. Olhou tanto que a mulher já estava pensando que tratava-se de assédio. Chegando em casa, correu para as agulhas e fez a amostra do desenho intrincado do casaco da mulher. E duas semanas depois, um suéter cor de telha estava pronto. Nunca vi nada igual. De suas proezas, esta mínima. O melhor mesmo são as histórias. E ontem, da forma mais absurda, o almoço de aniversário terminou com histórias de dor de barriga. 

Não sei como tal assunto chegou à tona. Mas, de repente, todos tinham uma história de dor de barriga para contar. As conversas lá em casa são assim: emergem do nada e as criaturas têm uma capacidade infinda de fazer intersecções das mais improváveis. Sei apenas que cada um veio com uma anedota, pois dor de barriga é ruim, mas depois, quase sempre vira comédia.  Quem nunca passou por um aperto intestinal, que atire a primeira pedra. Há coisa pior do que uma dor de barriga no meio de uma viagem? Uma vez, na graduação, íamos à Triunfo para um trabalho de campo. Não sei o que diabos comi, sei que quando passou de Arcoverde, comecei a suar e a me contorcer de dor de barriga. Próximo à Serra Talhada, disse a minha amiga Flávia que estava para morrer. Ela olhou-me e concordou, avisando-me que eu estava meio esverdeada. Num posto, foi feita uma paragem. Apesar de ter me servido de um banheiro terrivelmente sujo, até que consegui alguma melhora. Contudo, o trabalho era para visitar a zona rural de Triunfo, para vermos os engenhos banguês e as cachoeiras. E dor de barriga não dá só uma vez. Então, lá no meio do mato, numa trilha íngreme, repleta de seixos rolados, que o professor explicava demoradamente a formação dos anfibólios, eu aprendi que dor de barriga não dá só uma vez. Ao longe, avistei uma casinha humilde. Pensando na possibilidade de resolver o meu problema, acompanhada pela minha companheira, bati à porta, perguntando se podia usar o banheiro. A mulher olhou-me como se eu fosse um ET, e explicou, apontando com o dedo tosco: O banheiro é ali, atrás daquelas bananeiras. Eu pensei: pronto, lascou. Flávia, muito mais prevenida do que eu, disse-me que possuía papel higiênico. Menos mal. Fui para o tal banheiro natural, pedindo-lhe que ficasse vigiando, enquanto ela se torcia de rir. Quando eu estava lá, utilizando o tal banheiro in natura, avistei um boi. Pronto. Eu não sabia se corria (eu morro de medo de bois, já rejeitei até contrato de trabalho por causa desses bichos. Boi, só na panela ou no espeto!), ou se atendia aos apelos no meu intestino grosso em dissidio coletivo. E lá, naquela situação, eu dizia baixinho: Flávia, ô Flávia! espanta aquele boi! A amiga gargalhava e respondia: Eu não. Te vira aí, tu, tua dor de barriga e o boi. Eu tô fora. Só Jesus na causa. Terminada a obra, acompanhamos o grupo, já ouvindo o ronco da cachoeira. Entrei na torrente de água fria, sob o céu nublado, de roupa e tudo. Um dos melhores banhos da minha vida, sob o olhar da turma boquiaberta. Felizmente, o Prof. Ubirajara era mais doido do que eu, sacou fora a camisa e seguiu o meu exemplo. Talvez, um jeito eficiente de curar a ressaca. Daqui a pouco, estavam quase todos os alunos pulando das pedras, sob o olhar atônito do Prof. Carlos Guedes, que sempre foi muito arrumadinho, não ia nunca entrar numa bocada daquelas. A roupa, chapinhando água, secou pelo caminho. Chegamos ao engenho parecendo uma horda de malucos, meus cabelos (que na época eram longos e vermelhos) com tantos nós, que qualquer santa desatadora abriria da parada. 

É certo que o ditado em tela não refere-se especificamente aos desarranjos intestinais imprevistos. Minha história até que teve um final feliz, pois, vivemos na filosofia de fazer do limão uma limonada. Nas últimas semanas, tenho atravessado umas turbulências profissionais, que têm me forçado a pronunciar o NÃO como resposta com uma frequência maior do que estou acostumada. Não é que eu goste, mas como o cangaceiro do Auto da Compadecida, dou o não porque é o jeito.  Às vezes é necessário. Daí, talvez, o meu subconsciente tenha escolhido a figurinha do He-Man, para que a consciência entenda que dor de barriga  é recorrente, e, volta e meia, quem não confiou, desconsiderou e desprezou, pode voltar atrás. Talvez seja bem por isso que os populares dizem "pedir penico" para dizer que o fulano arrependeu-se. E, mal comparando, como diz o matuto, a dor de barriga real e inconveniente dá e passa, e depois de tudo, vira anedota  e rende umas boas risadas.

Até amanhã, fiquem com Deus.

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