E então, já chega o final dessa temporada. Vilma já havia me alertado que esses últimos prazos para a finalização da investigação são sempre conturbados. O prazo que temos fui eu mesma que me impus. Ainda poderia requerer prorrogação por mais um ano. Mas, há renúncias dolorosas em jogo, e eu confesso: cansei disso tudo. Cansei de sentir saudades. Quero outras lutas. Por ter dedicação exclusiva, muitos acreditam que tenho a vida mansa. Na verdade, o academic fight exige o nosso sangue. Não o mesmo que espirra nos octógonos do MMA, mas, minha força vital que se consome em dois anos e (quase) seis meses. O que eu quero agora é concluir uma versão provisória, juntar minhas coisas e voltar para minha casa, meu homem, minha família, minha cachorra. Belchior já o disse melhor do que eu: "Quero esquecer o francês."
Mas, cada um com suas lutas. Nesta semana, Luiza travou o (bom) combate inicial de sua vida de estudante. Nos dias 07 e 10 de maio, decorreram os Exames do Ensino Básico. Obrigatoriamente, todos os miúdos concluintes do 4º, 6º e 9º anos queimaram o juizo em avaliações de Português e Matemática. O exame tem o objetivo de verificar a aprendizagem nestas duas áreas, fundamentais para o prosseguimento da escolarização, de acordo com os padrões de ensino e de aprendizagem da UE. Apesar do público alvo ter pouca idade, a avaliação é rigorosa. Há mais de um mês, a professora de Luiza só trabalhava português e matemática, uma vantagem de ter uma só professora no primeiro ciclo. Os TPCs estavam cada vez mais complexos. Durante cinco finais de semana, Luiza trouxe apostilas de 5 ou 6 páginas de exercícios para resolver. Os domingos eram quase completos de mesa-e-cadeira, debruçada sobre problemas de uma matemática estranha para mim. O ensino mudou muito e a matemática não é refratária às inovações. Tinha um problema ótimo, era mais ou menos assim: "Um pescador pescou: 6 sardinhas, 7 carapaus, 2 robalos. Quantos irmãos tem o pescador?" Essa questão deu confusão na reunião com os encarregados da educação (a antiga reunião de pais e mestres). A mãe de Cátia estava indignada, consumimos um bom tempo da reunião, cuja pauta era prevenir os encarregados da educação das regras do exame, a discutir essa questão. Tantas novidades mexem com a sereninade de crianças e adultos, e os meninos logo mudaram o nome do exame de aferição para exame de aflição, com toda razão. Não sei se nós, os responsáveis, estávamos menos nervosos do que os miúdos.
Me impressionou a dinâmica de aplicação das provas e o padrão na execução das atividades. Para facilitar o controle no rigor na aplicação dos exames, unificaram o local de aplicação e todos os alunos das escolas do agrupamento vieram prestar as provas na João Afonso, onde a Escola da Glória está provisoriamente instalada. Apesar do grande número de meninos, a entrada e a saída foram muito tranquilas. Todos sabiam para onde ir, os listões foram previamente publicados nos murais externos das escolas. Ficaram 16 meninos por salas, organizados pelo número de inscrição. Um silêncio que nem todo adulto consegue manter pairava nos pátios. Os portugueses dão aulas de organização. As provas foram transportadas pela polícia e os "vigias" de sala eram professores desconhecidos aos miúdos. Os professores das turmas em avaliação só ficavam com os meninos na entrada, no intervalo e na saída, como coachings de pugilistas.
Logicamente, minha menina estava nervosissíma na noite da segunda feira. Às vezes, quando se lembrava, ela dizia: "ai, mãe, tem umas borboletas no meu estômago". De ansiedade, acordou-se às 4h da madrugada e assistiu tv até dormir novamente. Quando fui buscá-la para o almoço, estava aliviada. A prova de Português era mais texto do que gramática. Não houve classificação de palavras ou conjugação seca de verbos. Tudo contextualizado na discussão dos textos. Ontem, foi a prova de matemática. Mais geometria do que aritmética. E alguns problemas, mas nenhum na categoria do pescador e sua enigmática família. Apesar de matemática não ser propriamente o seu forte, ela foi mais tranquila ontem, a experiência aplacou a ansiedade. Agora é esperar o resultado, que será publicado no começo do mês de junho. E até lá, o cotidiano fica mais leve para os pequenos lutadores. Dois aspectos me chamaram muito atenção nesta experiência: i) Cá, as coisas são realmente levadas a sério. Não é porque o menino ainda tem 9-10 anos que ele tem que ser carregado no colo. Já é idade para responsabilidades. ii) Os meninos aprendem na prática que a vida não é fácil, e que, para ter sucesso é preciso muito trabalho. Não existe essa prática de fazer por menos, dá jeitinho, aprovar automaticamente. Não sabe? Ensina-se novamente e estude mais. Cada um faz a sua parte. Continua não sabendo? chumba (leva bomba, reprova). E volte para cursar a mesma série o ano que vem. Ninguém fica traumatizado por aprender como a vida funciona.
Enquanto isso, o tempo se escoa para mim. Felizmente, já ando construindo as fases finais da análise da minha (extensa) conversa sobre formação de professores em serviço através de Comunidades de Práticas online. Paralelamente, correm dois artigos e uma encomenda da AESGA. Assim, o tempo voa, e para acompanhá-lo, vou voando baixo também, acordando-me antes das 6h e encontrando cedo da manhã os últimos notívagos online dos trópicos. Vou preenchendo com letras, palavras e textos os 40 dias que me separam dele, uma provação de deserto, igual a que enfrentou Nosso Senhor.
Vale (quase) tudo nessa luta. Cada um com seu MMA.
Até amanhã, fiquem com Deus.
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