terça-feira, 10 de julho de 2012

Gente

Um olho em cada ecrã: vou procurando as palavras que andam meio soltas dentro da minha cabeça. Não só a mudança de hemisfério e de estação provoca a baixa concentração dos últimos dias. Do lado de cá, há muito o quê fazer e tudo desloca a minha atenção. Também, a minha casa parece casa de sítio (de quinta): é um entra e sai de criança, das 10h às 17h, com duas horas de intervalo para o almoço. Frequentemente sou convocada para arbitrar pendengas infantis, mediar conflitos. Com igual frequência, levanto da cadeira para ver onde estão os meninos, quando reina um silêncio suspeito.

O movimento na casa intensificou-se com as frequentes e inesperadas visitas dos membros do partido e correligionários, pois nós retornamos em pleno xadrez político das coligações para as eleições municipais. Seguindo a tradição da família Ferreira, Tony é, pela segunda vez, candidato a Vereador. E nestes dias de negociações e acertos, é preciso desligar todos os telemóveis para conseguir almoçar. Além disso, temos as pendências domésticas de ano e meio: o roupeiro (guarda-fatos) que desmoronou, a pia da cozinha que está vazando, a empresa de telefonia que me rouba a cada acesso à internet. Soma-se a isso o fato de termos um novo membro na família. Tony prometeu a Luiza um cãozinho, e quem quiser ter problemas, prometa alguma coisa a minha filha. Quando desembarcamos no Guararapes, Luiza já perguntou: “O Juca já chegou?” Uma semana depois, promessa cumprida, chegou o Juca numa pequena maleta de transportar pequenos animais. Um basset salsicha minúsculo, bem pretinho, com o peitinho castanho, a tremer de medo, procurou logo o abrigo nos braços da dona. Estivemos dias às voltas com o cãozinho, assediado pelas crianças da vizinhança, adaptando-se a nossa quase caótica vida doméstica. Não há nada mais difícil do que ensinar a um cão a fazer suas “obras” no sítio que julgamos indicado. Geralmente, eles escolhem o lugar mais improvável da morada e fazem dali a sua “casa de banho”. Hoje tivemos uma surpresa: a nossa vizinha, D. Socorro, examinou o bicho e atestou: “isso é uma cadela”. O Juca passou a ser Jujuba, pois ele é mesmo uma cachorra. Mytsi, com muita graça,  já havia me avisado que “os dessa raça são os pés da besta”, Ivania me alertou para o risco que correm as sandálias e os pegadores de roupa. A Juju gosta de agarrar com os pequenos dentes nas pernas das nossas calças, enquanto sacudimos o corpo do cão rosnante a cada passo. Meu quotidiano é um cômico filme italiano.

O retorno a AESGA, meu trabalho,  vem sendo suave. Estou disponível para uma pequena ajuda, uma troca de ideia, uma sugestão ao enfrentamento de algum problema. Participei de uma palestra e uma banca examinadora. Todos têm sido extremamente carinhosos e calorosos comigo, valorizando tudo faço ou que digo. Os meus colegas de trabalho são muito especiais, disponíveis e dispostos a ajudar, mesmo quando as suas condições não são favoráveis. O cansaço do final de semestre, os tumultos de ano eleitoral, os problemas comuns da vida não são barreiras para uma contribuição, uma partilha.
Nestes dias, tive o prazer de reencontrar especialmente quatro pessoas muito caras para mim: 1) Eliane. Minha querida amiga e professora, cada dia mais elegante, magrinha como eu nunca havia visto. Tive até cuidado para não quebrar ao abraça-la. Há quem pense que é falsidade ou conveniência quando falo bem de Eliane. Estas pessoas desconhecem a importância dela nas decisões de todos esses caminhos que tenho percorrido. No futuro, quem sabe quando escrever a minha biografia haverá certamente um capítulo reservado para esta mulher fantástica. Linda para além de toda a beleza. 2) Genésia. Minha mãe honoris causa. Longe de coincidência, ela é a mãe do meu orientador. Nem precisa dizer que de 2001 até hoje tem sido a pessoa que mais respeito em cima deste mundo. É uma das poucas pessoas que me faz “dobrar a orelha”, me aconselhando carinhosamente. 3) Thayze. Uma menina de quem me sinto tia, uma profissional competente, uma professora dedicada. Ela nem imagina o quanto tem me ajudado no percurso desta formação. Assumiu corajosamente as bombas que eu desarmava, e com competência, formou equipe, imprimiu o seu ritmo. Agora, vive um momento especial de sua vida, em que terá que fazer escolhas. Vai perceber por si só que não é possível fazer tudo já que a prioridade, ela carrega em si. 4) Clodoaldo, o primo. Pessoa admirável que se diz de alta periculosidade. Este rapaz me liga quando tem novidades, nem sempre são boas. Algumas são devastadoras para os pobres mortais. Não para ele, que enfrenta as armadilhas da vida com serenidade e muita graça. Depois que falo com ele, envergonha-me abrir a boca para reclamar da minha própria desorganização, da minha baixa motivação. Eu que deveria encoraja-lo, mas o danado não permite: é uma usina de força; uma força que só pode ser de Deus.
As pessoas são a minha fonte de inspiração. É nelas que encontro motivo e assunto. Seja família, agregado, vizinho, amigo ou colega de trabalho, presente ou virtual, é através delas que leio o mundo. Cada um a sua maneira, contribuem para a construção do mundo tal como o percebo.
Gente que eu amo, sinceramente.
Até amanhã, fiquem com Deus.

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